sábado, 25 de novembro de 2017

Carta de Julieta Stein ao saber a morte de sua mãe, Doralice (esposa de Bartholomeu Stein)

Esta carta foi escrita por Tia Lia/Lieta (Julieta Stein Grangeiro), dirigida à sua irmã, Flávia, logo após saber do falecimento de sua mãe, nossa avó, Doralice Silva Stein, fato ocorrido em 13-10-1937, conforme relata Tia Maria Eugênia, em carta de igual data, cuja cópia já digitei e mandei para todos, no ano passado. Mantive quase inteiramente, a grafia original.
Ressalta em todas as cartas trocadas entre as irmãs a preocupação com a sorte das demais irmãs. Estas foram levadas por cada uma das irmãs de nossa avó, Doralice e tiveram o seu devido encaminhamento na vida. Exceção foram:

  1. minha Mãe Flávia, que já estudava em Passo do Sobrado, em casa da Tia Helena, irmã de nosso avô Bartholomeu e que era casada com Ignácio Frederico Stoll, advogado. Depois de formada na Escola Complementar desta cidade, foi lecionar em Tupanciretã, em uma fazenda (Fazenda São Domingos, à 4 léguas, 24 km. da cidade), para os filhos do fazendeiro (Sr. Telâmaco). Logo depois, casou-se com meu pai, Ozy Pires Garcia, indo morar inicialmente em Psso do Sobrado, que era distrito de Rio Pardo e hoje é município autônomo;
  2. Tia Helena que foi enviada para o internato das freiras. Em carta de 26-06-1939, Tia Lia, diz que “... não escrevo para a Helena porque as freiras lêem as cartas!”.

Rio, 17-10/1937.
Flávia, minha maninha querida!

Ante a brutalidade do golpe que nos feriu, onde encontrar palavras para exprimir a bossa dor?!
Nunca pensei, Flávia, nunca supus que pudéssemos perder tão bruscamente a nossa adorada Mãezinha! (1)
Meu pensamento paira no ar, maninha e não quer aceitar a realidade horrível deste momento amargo de nossa vida. E os nossos irmãozinhos?... Que é feito deles? Como suportaram este golpe cruel, sem o carinho e a proteção dos irmãos mais velhos? Nada sei. Apenas recebi num telegrama igual aos outros esta notícia cruel que nos dilacera o coração, que destruiu a alegria de nossa existência! E temos que nos conformarmos! É Deus que assim determinou. Os tios, os nossos bondosos titios, tudo fizeram pela Mãezinha e tudo farão por nós; não devemos desesperar! A apenas 3 anos perdemos (2) o nosso Paezinho querido, o nosso bom Sylvinho (3) e, como se não bastasse tento sofrimento, Deus, esse Deus tão bom ao Qual devemos amor e submissão, nos rouba sem piedade o que mais amávamos neste mundo! O nosso maior tesouro, a nossa Mãezinha amada, tão moça, tão dedicada, tão boazinha! Não, Flávia, é cruel!...

Recebi uma carta aérea do Juca (4) do dia 13 deste; andava apreensivo com a doença da Mãezinha e aborrecido por não lhe termos escrito mais. É bonzinho o nosso irmão, devemos lhe desculpar os defeitos e fazer-lhe sentir que não é só neste mundo; que tem umas irmãzinhas que lhe tem muita estima: endereço dele: Banco do Brasil, II andar, sala 12.

Titia melhorou? Desejo que fique inteiramente restabelecida. Não escrevi para a Maria (5) e crianças, devem estar em Taquara, (6) é suposição, nada sei. Desejas conservar a nossa casa? (7) Espero que os titios me consultem a respeito e desejo a tua opinião o quanto antes. Titia e priminhos têm me cercado de todo o carinho e, estão como eu, acabrunhados!

Enviam-te um grande e confortador abraço! A Ruth (8) portou-se como uma maninha dedicada e afetuosa!

Que faremos com os nossos maninhos? Tenho pensado tanto nisso! Não, não, Flávia, que coisa horrível! Não posso acreditar! E, no entanto, é a verdade, triste verdade! Se fosse apenas um sonho, como seria delicioso despertar!...

Órfãos, sós no mundo! E quantos como nós e em piores situações, sem parentes dedicados, sem amigos!... É muito triste este mundo!...

Aceita n’um grande, carinhoso e fraternal abraço todo o consolo que te posso dar: sofremos juntos, unidos nesta dor imensa. Unidos sorriremos um dia, sabendo que os nossos Pãezinhos amados lá do céu, nos abençoam.

Beija-te, com ternura, a tua Lieta.

Convite da missa de 30 dia no Rio de Janeiro
Diário da Noite 1937 edição 03083 - 11 novembro de 1937 - fonte 


1 Dona Doralice nasceu a 13 de Novembro de 1896. Portanto, tinha 41 anos apenas, quando faleceu em 13-10-1937.
2 : Dr. Bartholomeu recebeu os S. Sacramentos dia 26 de Maio de 1934, das mãos de seus amigos Padre Carlos Thomaz Broggi, Vigário de Rio Pardo e faleceu no dia 15 de Junho de 1934 às 11 horas da manhã em sua residência no Capivari 5º. Distrito de Rio Pardo. Está enterrado no Cemitério dos Franco, próximo de sua residência. Faleceu com 63 anos, 5 meses e 25 dias.
3 Sylvio Villar Stein, filho do Dr. Bartholomeu, com sua segunda esposa D. Alice Villar de Sá, filha legítima de José Villar de Sá e de D. Marcolina Maya de Sá, ocorrido em 28 de Maio de 1910. Faleceu prematuramente em 13-07-1934, em Porto Alegre, às 5 horas da madrugada. Está enterrado com sua mãe e irmãs no Cemitério São José. Faleceu de anemia perniciosa – estava doente há 7 meses, tinha 21 anos, 4 meses e 10 dias. Era empregado na firma F. Segura e Cia. Ltda., no Butiá, município de São Jerônimo. Era noivo da Srta. Edy Araújo Gonçalves, filha da Viúva Conceição Gonçalves”).

4 José Carlos Villar Stein, ou Juca, nasceu no dia 4 de Abril de 1911 à rua Gen. Vitorino no. 30.

55. Maria Eugênia nasceu em 3 de Maio de 1921 e foi batizada em 5 de Setembro de 1926, em Teresópolis.
6 Na cidade de Taquara/RS, proximo de Porto Alegre, moravam a Tia Palmyra e seu marido, Tio Costa, que era gerente do Banco do Estado do Rio Grande do Sul. Eles acolheram a Tia Maria Eugenia após o falecimento de nosso avô Bartholomeu, com vistas a sua educação e para reduzir as pessoas que ficaram com a Vó Dora, com a qual permaneceram apenas os de menor idade.
7 Em carta de 14-04-1938, dirigida à tia Maria Eugenia, minha Mãe, Flávia, pergunta”... para que cortaram os eucaliptos? Credo! Se eu estivesse aí, não consentiria (se é que poderia dar minha opinião...) Nossa casa para mim é sagrada... tudo organizado e plantado pelos nosso amados Paezinhos!... Sinto como tu, que não poderei ver nossa casa sem ter a impressão de que irei ver a Mãezinha tão querida, que aí ficara tão alegre e querida!... Por amor do Bom Deus... Pobre Mãezinha! Pobres maninhos amados!...”
A casa foi mantida quase intacta, por muitos anos, e depois, creio que na metade dos anos 50, foi desmanchada pelo Tio Cláudio com vistas a ser novamente re-erguida em Dom Marcos, fato que não se realizou. Havia um pomar em que tinha uma imensa variedade árvores frutíferas.


8 Ruth Silva Costa, já falecida, casou-se com Ruy de Paula Couto, primo dela e filho da Tia Julieta, irmã de sua mãe, Palmyra.

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