domingo, 26 de novembro de 2017

Família de Doralice Stein (esposa de Bartholomeu Stein)

1. Crescêncio de Deus e Silva   n. Jan 10 1861  -  m. Abr 18 1911
m.Nov 23 1878 Belmira Maria  Costa e [Silva]   n. Jan 14 1860

1. Julieta Silva [Couto]   n. Jul 6 1882  -  m. Fev 3 1960
m.Tito Paula Couto   n. Out 31 1858  -  m. Nov 30 1925
2. Maria Emília Silva   n. Dez 4 1883
m.Rafael Silva
3. Petronilha Silva   n. Jun 29 1885  -  m. 1920
m.1904 Marcellino Antonio Silva
4. Olympia de Deus e Silva   n. Abr 4 1887
5. Carlindo Deus e Silva   n. Jan 17 1891
6. Doralice da Silva [Stein]   n. Nov 13 1896  -  m. Out 13 1937
m.Ago 14 1915 Bartholomeu Stein   n. Jan 20 1871  -  m. Jun 15 1934
7. Oswaldo Deus e Silva   n. Mai 30 1899  -  m. Mai 1 1984
m.Elsa  Alves da Silveira [Silva]   n. Jan 21 1902  -  m. Fev 4 1936
m.Jeni Silva
8. Deolinda Silva
m.Antonio Silva
9. Ondina Silva
m.João da Silva Costa
10. Adylles Silva [Willecke]
m.José Willecke
11. Anaurelino Deus e Silva
m.Maria da Gloria e Silva
12. Arlindo Deus e Silva   m. 1958
m.Candida Mariante [Silva]
13. Palmira Silva [Costa]
m.José  da Silva Costa

Batismo de Belmira Costa

Batismo de Crescêncio de Deus e Silva


Registro de casamento de Crescêncio e Belmira em 1878 em Viamão





Batismo Doralice




sábado, 25 de novembro de 2017

DOZE ANOS DEPOIS DE BARTOLOMEU STEIN

Continuando a narrativa da saga dos descendentes do Dr. Bartolomeu, me proponho a narrar os fatos que vivenciei uns doze anos depois.

Como complemento da narrativa das tias, informo que a Fazenda da Boa Fé, em que elas moraram antes de ir para o Ranchão e posteriormente para a Chacrinha do Passo do Canto, pertencia a Manoel Osório Simões Pires, avô do Ozy, portanto meu bisavô.

Depois que ele faleceu, a localidade ficou sem assistência médica o que deu margem a que um enfermeiro que atuava com ele de nome Ananias, tentando talvez suprir esta falta, ou aproveitando-se dela, recolheu o instrumental e livros da casa do Dr. Bartolomeu e iniciou uma charlatanice que se estendeu por muitos anos, passando então a ser chamado de Dr. Ananias, e sua mulher Eronita a exercer a função de parteira.

Sou filho de Flávia e Ozy, já mencionados nas lembranças da Tia Helena e Maria Eugênia.

Depois do falecimento de meu avo Bartolomeu e de minha vó Doralice, minha mãe estava terminando os estudos em Passo Fundo, quando formada foi lecionar em São Domingos, logo em seguida meus pais se casaram, indo morar inicialmente em Passo do Sobrado, um distrito de Rio Pardo, ele com sub-delegado de polícia e ela como professora.

Nesta ocasião a Tia Maria foi morar com eles, já que com a morte de meus avos, ela tinha ido, na função de professora dos filhos do Sr. Zeca Garcia, tio de meu pai.

O Tio Cláudio, já com sete anos, foi acolhido por meus pais que terminaram sua criação, minha mãe tem verdadeira adoração por ele.

Em pouco tempo eles se transferiram para as Aroeiras, pertinho do Capivari, já tendo nascido, nesta ocasião, o Paulo e o Carlos, tia Maria continuava morando em nossa casa e auxiliando a cuidar das crianças, até se casar com o tio Pantaleão. Tinha predileção pelo Carlos.

Como meu avô Timóteo, havia se mudado para o Dom Marcos, onde adquiriu os campos de todos os seus irmãos, providenciou a fundação da Escola Isolada do Capivari, dentro de seus campos no Capivari, próximo a Chacrinha onde moraram meus avos maternos, entre a casa e o galpão, especialmente para que minha mãe fosse lecionar, dava aula para o 1º, 2º, 3º, 4º e 5º juntos, ou seja se dividia o pequeno quadro em cinco partes e ia passando as lições para cada turma. Note-se que tinha que fazer os planos de aula para as cinco classes e corrigir provas. Uma trabalheira!

Nesta casa foi que vivi a minha infância, juntamente com meus irmãos Paulo e Carlos e com a Maria Helena que nasceu logo depois de mim e depois o Guido e o Lúcio, alem da Margarida que era filha de criação, e do Índio que depois veio a ser pára-quedista.

Foi uma infância maravilhosa, minha mãe pelo que sei agora, herdou o modo de pensar e viver de meu avo Bartolomeu, nos ensinou a viver o aqui e o agora, a ver a beleza das pequenas coisas.

Nossa casa não possuía luxo, a água era puxada em uma pipa lá da fonte, luz era de lampião a querosene ou o famoso “burro” também a querosene ( houve um tempo em que possuímos um lampião a carbureto, que até hoje lembro do cheiro, e que era impossível apagar, tinha que ser posto na rua até que a chama se extinguir).

A roupas para esta “tropinha”, a maior das vezes as tias da cidade mandavam, (quase sempre a Tia Helena). Era uma festa quando chegavam, pois de uma hora para outra estávamos cheios de roupas e sapatos, que dávamos um jeito de usar mesmo que não fossem nossos números.

O mundo era o nosso campo onde nos sentíamos senhores. Tomávamos banho de sanga, andávamos á cavalo, caçávamos passarinho, participávamos das lides do campo, os empregados tinham todas as deferências. Nos chamando de “sinhozinho”. Depois do almoço na hora da sesta aprontávamos artes e estripulias, já que os nossos pais estavam dormindo. A mesa era farta, pois a maioria era produzida em nossa propriedade.

Nosso meio de locomoção era o cavalo e a carroça. Quando alguém ficava doente, o Pai ou um peão ia lá no Outro Lado buscar a caminhão do Seu João Iserard, para levar a Rio Pardo. Em caso de não conseguir transporte, ia-se a Monte Castelo, e chamava-se um Carro de Praça de Encruzilhada, (normalmente o Seu Teophilo), que já vinha com o Dr. Clóvis para medicar o enfermo e já dar uma olhada nos outros.

Quando a Tia Helena e o Tio Paulo vinham passar as férias em seus flamantes automóveis, primeiramente o Austin A-40 e depois o Dodge, era uma festa, pelos presentes que trazia e pelos passeios de carro que nos proporcionavam. Poder admirar um automóvel por um tempo maior do que as raras vindas do Seu Teophilo, era um deslumbramento para todos.

Nestes dias matavam-se galinhas, tinha carne de ovelha em abundância e se vivia a tripa forra, era uma festa só.

Um belo dia chegou o caminhão do Eni, (filho do Tio Zeca – aquele em que a tia Maria foi morar depois da morte do vô) carregado com muitas tábuas. A Mãe um pouco chorosa disse que eram da casa onde ela morava na Chacrinha. Confesso que olhei com reverência aquelas tábuas de madeira de lei, fortes majestosas mesmo a meus olhos. Parte destas madeiras ficou no Capivari e a outra parte foi para a casa da Tia Maria lá no Dom Marcos. Com a que ficou no Capivari foi feito o soalho de nossa varanda (ainda hoje estão lá, incólumes ao tempo). Lembro do gostoso que era deitar neste assoalho recém lavado e ainda úmido nos quentes dias de verão do Capivari.

As que foram para a casa da Tia Maria lá no Dom Marcos, foram feitas as paredes do galpão.

Em nossa casa não tínhamos frutas, a não ser os figos da figueira na parte de trás da cozinha e as saborosas pitangas que são abundantes e os guabijus silvestres.

Já havíamos cruzado pela frente, mas nunca chegamos, na Chacrinha do vô “BERTO” como o pessoal de lá chamava, quando se ia ao cemitério nos finados, mas nunca chegamos. No dia de finados para nos era uma festa, levantava-se cedo colhíamos as flores margaridas, rosas, papoulas (a mãe dizia que eram de sementes que trouxe lá da casa onde o vô morava, com as quais fazia sedativos para seus doentes) .

Um dia a Mãe nos mandou eu e um filho de um agregado ao Passo do Canto ver se tinha alguma fruta lá na Chacrinha do meu falecido avô Bartolomeu, levamos uma manhã inteira para chegar lá (ficava a uns 8 km de nossa casa). Quando apeamos e fomos pelo meio das altas ervas daninhas encontramos um arvoredo carregado de frutas, bergamoteiras com suculentas bergamotas, um pé de uma laranja descomunal, que foi a primeira que colhemos, tinha a casca grossa e era intragável (laranja de doce), marmelos, laranjas, figos, romãs, até umas poucas uvas.

Saímos de lá carregados de frutas, o que era uma novidade e um deslumbramento para nos que não as dispúnhamos lá em casa. A partir daí todos anos íamos lá nos abastecer, das frutas que meu avô tinha plantado e que estavam servindo de deleite para seus netos.

Apesar das dificuldades, consegui me formar em engenharia, casei com a Vanessa, a quem vim a conhecer aqui em Porto Alegre, e depois descobri que era filha do Seu Ciríaco, nascido no Passo da Ana Benta, também no Capivari.

Moro em Porto Alegre, e para meu orgulho tenho uma filha, a Cristina que formou-se em medicina, retomando a saga do Dr. Bartolomeu.




Flávio Luiz Stein Garcia



Porto Alegre, 23 de Agosto de 2007

Carta de Julieta Stein ao saber a morte de sua mãe, Doralice (esposa de Bartholomeu Stein)

Esta carta foi escrita por Tia Lia/Lieta (Julieta Stein Grangeiro), dirigida à sua irmã, Flávia, logo após saber do falecimento de sua mãe, nossa avó, Doralice Silva Stein, fato ocorrido em 13-10-1937, conforme relata Tia Maria Eugênia, em carta de igual data, cuja cópia já digitei e mandei para todos, no ano passado. Mantive quase inteiramente, a grafia original.
Ressalta em todas as cartas trocadas entre as irmãs a preocupação com a sorte das demais irmãs. Estas foram levadas por cada uma das irmãs de nossa avó, Doralice e tiveram o seu devido encaminhamento na vida. Exceção foram:

  1. minha Mãe Flávia, que já estudava em Passo do Sobrado, em casa da Tia Helena, irmã de nosso avô Bartholomeu e que era casada com Ignácio Frederico Stoll, advogado. Depois de formada na Escola Complementar desta cidade, foi lecionar em Tupanciretã, em uma fazenda (Fazenda São Domingos, à 4 léguas, 24 km. da cidade), para os filhos do fazendeiro (Sr. Telâmaco). Logo depois, casou-se com meu pai, Ozy Pires Garcia, indo morar inicialmente em Psso do Sobrado, que era distrito de Rio Pardo e hoje é município autônomo;
  2. Tia Helena que foi enviada para o internato das freiras. Em carta de 26-06-1939, Tia Lia, diz que “... não escrevo para a Helena porque as freiras lêem as cartas!”.

Rio, 17-10/1937.
Flávia, minha maninha querida!

Ante a brutalidade do golpe que nos feriu, onde encontrar palavras para exprimir a bossa dor?!
Nunca pensei, Flávia, nunca supus que pudéssemos perder tão bruscamente a nossa adorada Mãezinha! (1)
Meu pensamento paira no ar, maninha e não quer aceitar a realidade horrível deste momento amargo de nossa vida. E os nossos irmãozinhos?... Que é feito deles? Como suportaram este golpe cruel, sem o carinho e a proteção dos irmãos mais velhos? Nada sei. Apenas recebi num telegrama igual aos outros esta notícia cruel que nos dilacera o coração, que destruiu a alegria de nossa existência! E temos que nos conformarmos! É Deus que assim determinou. Os tios, os nossos bondosos titios, tudo fizeram pela Mãezinha e tudo farão por nós; não devemos desesperar! A apenas 3 anos perdemos (2) o nosso Paezinho querido, o nosso bom Sylvinho (3) e, como se não bastasse tento sofrimento, Deus, esse Deus tão bom ao Qual devemos amor e submissão, nos rouba sem piedade o que mais amávamos neste mundo! O nosso maior tesouro, a nossa Mãezinha amada, tão moça, tão dedicada, tão boazinha! Não, Flávia, é cruel!...

Recebi uma carta aérea do Juca (4) do dia 13 deste; andava apreensivo com a doença da Mãezinha e aborrecido por não lhe termos escrito mais. É bonzinho o nosso irmão, devemos lhe desculpar os defeitos e fazer-lhe sentir que não é só neste mundo; que tem umas irmãzinhas que lhe tem muita estima: endereço dele: Banco do Brasil, II andar, sala 12.

Titia melhorou? Desejo que fique inteiramente restabelecida. Não escrevi para a Maria (5) e crianças, devem estar em Taquara, (6) é suposição, nada sei. Desejas conservar a nossa casa? (7) Espero que os titios me consultem a respeito e desejo a tua opinião o quanto antes. Titia e priminhos têm me cercado de todo o carinho e, estão como eu, acabrunhados!

Enviam-te um grande e confortador abraço! A Ruth (8) portou-se como uma maninha dedicada e afetuosa!

Que faremos com os nossos maninhos? Tenho pensado tanto nisso! Não, não, Flávia, que coisa horrível! Não posso acreditar! E, no entanto, é a verdade, triste verdade! Se fosse apenas um sonho, como seria delicioso despertar!...

Órfãos, sós no mundo! E quantos como nós e em piores situações, sem parentes dedicados, sem amigos!... É muito triste este mundo!...

Aceita n’um grande, carinhoso e fraternal abraço todo o consolo que te posso dar: sofremos juntos, unidos nesta dor imensa. Unidos sorriremos um dia, sabendo que os nossos Pãezinhos amados lá do céu, nos abençoam.

Beija-te, com ternura, a tua Lieta.

Convite da missa de 30 dia no Rio de Janeiro
Diário da Noite 1937 edição 03083 - 11 novembro de 1937 - fonte 


1 Dona Doralice nasceu a 13 de Novembro de 1896. Portanto, tinha 41 anos apenas, quando faleceu em 13-10-1937.
2 : Dr. Bartholomeu recebeu os S. Sacramentos dia 26 de Maio de 1934, das mãos de seus amigos Padre Carlos Thomaz Broggi, Vigário de Rio Pardo e faleceu no dia 15 de Junho de 1934 às 11 horas da manhã em sua residência no Capivari 5º. Distrito de Rio Pardo. Está enterrado no Cemitério dos Franco, próximo de sua residência. Faleceu com 63 anos, 5 meses e 25 dias.
3 Sylvio Villar Stein, filho do Dr. Bartholomeu, com sua segunda esposa D. Alice Villar de Sá, filha legítima de José Villar de Sá e de D. Marcolina Maya de Sá, ocorrido em 28 de Maio de 1910. Faleceu prematuramente em 13-07-1934, em Porto Alegre, às 5 horas da madrugada. Está enterrado com sua mãe e irmãs no Cemitério São José. Faleceu de anemia perniciosa – estava doente há 7 meses, tinha 21 anos, 4 meses e 10 dias. Era empregado na firma F. Segura e Cia. Ltda., no Butiá, município de São Jerônimo. Era noivo da Srta. Edy Araújo Gonçalves, filha da Viúva Conceição Gonçalves”).

4 José Carlos Villar Stein, ou Juca, nasceu no dia 4 de Abril de 1911 à rua Gen. Vitorino no. 30.

55. Maria Eugênia nasceu em 3 de Maio de 1921 e foi batizada em 5 de Setembro de 1926, em Teresópolis.
6 Na cidade de Taquara/RS, proximo de Porto Alegre, moravam a Tia Palmyra e seu marido, Tio Costa, que era gerente do Banco do Estado do Rio Grande do Sul. Eles acolheram a Tia Maria Eugenia após o falecimento de nosso avô Bartholomeu, com vistas a sua educação e para reduzir as pessoas que ficaram com a Vó Dora, com a qual permaneceram apenas os de menor idade.
7 Em carta de 14-04-1938, dirigida à tia Maria Eugenia, minha Mãe, Flávia, pergunta”... para que cortaram os eucaliptos? Credo! Se eu estivesse aí, não consentiria (se é que poderia dar minha opinião...) Nossa casa para mim é sagrada... tudo organizado e plantado pelos nosso amados Paezinhos!... Sinto como tu, que não poderei ver nossa casa sem ter a impressão de que irei ver a Mãezinha tão querida, que aí ficara tão alegre e querida!... Por amor do Bom Deus... Pobre Mãezinha! Pobres maninhos amados!...”
A casa foi mantida quase intacta, por muitos anos, e depois, creio que na metade dos anos 50, foi desmanchada pelo Tio Cláudio com vistas a ser novamente re-erguida em Dom Marcos, fato que não se realizou. Havia um pomar em que tinha uma imensa variedade árvores frutíferas.


8 Ruth Silva Costa, já falecida, casou-se com Ruy de Paula Couto, primo dela e filho da Tia Julieta, irmã de sua mãe, Palmyra.

Carta de Maria Eugênia sobre a morte de sua mãe Doralice Stein (esposa de Bartholomeu Stein)

Taquara, 17-10-937.

Querida maninha Lieta,

Abraço-te e aos primos e Titia, com grande dor e saudade; a ti o meu grandessíssimo abraço na dor que ora nos une, a dor mais acerba que já sofremos! Calculo como deves estar preocupada com nossa sorte! ... Como deves estar inconsolável com a perda de nossa muito amada Mãezinha! Consola-te, Deus não quis que a tivéssemos mais anos, roubou-n’a tão cedo! Era tão moça e parecia tão forte...

Há quase um mês, ou mais, não te escrevia, nem sei como começar esta, depois de tudo o que aconteceu! Deves saber que tia Palmyra, tio Osvaldo, tio Juca e tia Deolinda foram até lá, nossos bons tios foram incansáveis, inclusive os vizinhos e seu Zeca, esta foi mais que nosso Pai; tudo fizemos para nossa Mãezinha; faleceu dia 13 às 7 horas da noite, dia 15 saímos de lá com os queridos titios e depois de mil peripécias chegamos aqui em Taquara, onde estamos com os titios que são nossos segundos Pais! São bons, muito bons!!!

Passamos um telegrama ai para vocês, porém nada recebemos, de resposta nem o cheiro!... Nem carta recebemos mais, desde que Mãezinha adoeceu, estranhamos muito a absoluta falta de notícias daí, eis porém que a querida Ruth escreve e manda dizer que tu passaste um telegrama pedindo notícias, lá, porém, não chegou.

Claudinho foi com o tio Osvaldo, ia muito satisfeito; separamo-nos e ele parecia não sentia muita falta nossa; tio Osvaldo e tia Deolinda foram com ele. Da Flávia não recebi ainda nada, imagino como não está inconsolável, ela que é tão amorosa!... Dia 15 recebi carta dela, pedia notícias da Mãezinha, ainda não sabia do triste acontecimento que nos feriu ainda nem respondi, pretendo escrever-lhe hoje.

Bem, agora vou passar a contar a doença de nossa Mãe, pois deves estar ansiosa por saber: Mãezinha adoeceu dia 26, à noite, teve um desmaio, que durou uma meia hora, afinal depois de muito óleo canforado e café bem forte veio a si, estávamos sós, com o Francisco; mas antes disso ela tinha tido gripe e um furúnculo horrível, creio que te mandei dizer, não? No dia 27 mandei chamar o seu Zeca Garcia, ele queria mandar chamar o Dr. Gastão, mas a Mãe não quis, alegando sentir-se bem, então ela mandou o Maurício à Encruzilhada buscar remédios, depois de um ou dois dias ela pediu o médico, foram ao telefone e chamaram o Dr. Gastão que prontamente veio e foi muito atencioso; constatou ser infecção do sangue, e um caso muito grave! Dr. Gastão foi até lá diversas vezes, Ozy sempre ia junto. Durante toda a doença a casa vivia cheia de gente, era até demais, todos queriam servir; foram incansáveis, coisa mesmo difícil de contar; seu Zeca, então, nem se fala!!! Injeções e remédios era um horror! Felizmente nada faltou, teve tudo a tempo e a hora, injeções quantidades, não se achava mais lugar para fazer uma! Estava também com reumatismo no pescoço e num braço, passou dores horríveis, insuportáveis; na cabeça pareciam máquinas, tão grande era o zumbido! Ela pedia muito um Padre, por isso e mesmo por achá-la mal, mandamos chamá-lo, não podendo vir o Padre Thomas Broggi, deu ordens ao da Encruzilhada, o qual veio dia 5, às 11 horas e administrou-lhe todos os Santos Sacramentos. Mãe ficou deveras contente e melhorou consideravelmente depois dos S. Sacramentos, rezou muito, depois piorou novamente, quase não falava, tendo já antes feito todos os pedidos e recomendações. Imagina nossa aflição, eu andava nervosíssima, pois via que ela estava mal, e mesmo não m’o escondeu.

Eu fiquei encarregada do tratamento tendo Dr. Gastão deixado escrito nas caixas, pois o tratamento todo constava de injeções, óleo canforado e nem sei o que mais! A temperatura nunca baixava de 39 a 40, dia 13 tinha 41 e 8, foi a última vez que tirei, nessa tarde ela ficou com o ventre inchado, sem fala, não conhecia mais ninguém, e às 7 horas faleceu, assistiram seu último suspiro: seu Zeca, Nário, seu Olimpo, D. Lida, à mim não deixaram entrar no quarto, mas eu vi que ela ia exalar o último suspiro, e de fato!...Há tempos desde que adoeceu não se dormia mais, apenas por noite uma, duas, três ou quatro horas no máximo, pois fazia-se “quartos”. Como aquele pessoal foi atencioso e serviçal!... Indescritível!!! Seu Timóteo e família, Edegar, seu Olímpio e fam., Cid e fam., Cecília, Vicente, etc... Pessoal do seu Bibi, enfim todos foram muito atenciosos, coisa nunca vista!

Nazico voava para trazer remédio; Maurício também ajudou muito.

As despesas foram fabulosas! Bem, já estou um pouco esquecida, e mesmo cansada, ainda tenho de escrever à Flávia, por isto vou parar um pouco.

Lá em casa deixamos tudo encaixotado, quer dizer tudo que vai se trazer para aproveitar; móveis fez-se uma relação que é para vender, ficou encarregado o seu Zeca de tudo lá. Deu-se muita coisa, aquele pessoal que tanto serviu era impossível cobrar. Enfim, foi uma tristeza; principalmente a pior coisa foi que tudo foi sem resultado, pois se tivéssemos ficado com nossa Mãezinha neste mundo, não tinha sido nada, mas Deus não quis que assim se desse, privou-nos dos doces carinhos, daquela nossa tão amada Mãezinha! Mas o que nos resta é consolar-nos com o que Deus determinou, achamos tios bons e serão pessoas que nos tem auxiliado e confortado! Deus os há de abençoar e fazê-los felizes!

Mãezinha perguntava muita por ti, se tu não vinhas, etc. respondíamos que ainda não, depois de ela muito perguntar e sempre recebendo negativa, disse: “pois então não pergunto mais, por ela, que sempre foi tão querida minha!”. Na Flávia falava muito! A toda hora! Deixou um pedido pra vocês: que cuidassem de nossa educação – era a única coisa que pedia a vocês, e que se conformassem, pois ela já estava conformada! – Pediu-me muitas coisas, fez-me muitas recomendações! Não me deixava sair do quarto nem um momento, logo que eu saia já ela me chamava e perguntava onde eu estava. Bem, maninha de minh’alma, vou terminar, já chega de prosa.

Peço-te aceitares com os bons tios e priminhos nossos saudosos abraços.

Aceita querida irmã, o coração cheio de dor e saudade da tua irmã e amiga que, como tu, sente a mesma dor.

Beija-te a tua

Maria

P.S.: Lieta,

Peço-te enviares este a Flávia, imediatamente haveres lido, pois não fiz descrição exata na carta para ela.

É favor.

Beijos

Maria




Observação: Fiz a transcrição de carta de próprio punho de minha Tia Maria Eugenia que, na época, tinha apenas 16 anos. Peço notar o português correto, onde fiz poucas alterações, apenas atualizando palavras que tiveram suas grafias alteradas posteriormente. Nada mais alterei Não notei quaisquer erros relevantes de português na bela caligrafia que ela tinha e tem ainda, e que em nada se alterou.

Notem, também, a descrição adequada que ela faz, os poucos recursos médicos que havia na época e, ainda mais, considerar que o local era totalmente distante de qualquer cidade, pelo menos 40 km. E havia muito poucos carros na época e no local, acredito, nenhum.

A maturidade de minha tia em assumir e tratar minha avó e em descrever, com absoluta fidelidade o mal que a acometeu (infecção do sangue: septicemia; pergunto: poderia ser também, alguma doença de origem meningocócica ?).

Carlos Eugenio Garcia

Carta da Lieta para a Flávia em 1936

(Lieta é Julieta Stein, filha de Bartholomeu e Doralice Stein e Flávia é sua irmã)
Rio, 08 de Julho de 1936 - 14 horas e 25 minutos durma tarde linda e fresca do nosso inverno maravilhoso! .....

Flávia, minha maninha querida......

Não calculas querida irmã, o prazer imenso que me causaste com a tua linda carta de 30 de maio de 1936, há dias recebida! Muito bem escrita, alias, como todas elas. Vamos bem graças a Deus; e tu como vais? Teus estudos vão bem? Nossos bons tios e primos vão bem? Luisinha vai bem nos estudos? Faço votos para que termine muito bem seus estudos. 

Acabo de escrever para a Maria, em resposta a uma dela do dia 06 de junho recebida a seis dias. Vão todas bem, lá na casa, graças a Deus. Deram-me notícias tuas e do Juca e da Tilinha que felizmente vão bem. O Juca continuava desempregado e pretendia passar alguns dias lá em casa, parece que o Edgard vai por gabinete dentário lá. Era bom para a nossa Mãezinha, não é Flávia? Assim ela ficava mais acompanhada! Em Porto Alegre e Taquara todos bem. Dia 06 Magalhães embarca para cá dia 9, a Irene irmã dele casou. A Ziláh vai bem. Carlos escreveu, vai bem. Tempo belíssimo faz aqui! Sem chuvas dede 02/05 e agradável sem frio e sem calor. Manhãs claras e lindas, todas encantadoras, noites deliciosas de luar, tristes.....muito tristes!..... Eis o nosso tempo de inverno, e o outro “ nosso e o daí ? gelado e chuvoso? Nevoeiros que não mais terminam? Como vão de saúde ? Nada de gripes, é o que desejo. Nós três vamos bem, graças a Deus. Como deves saber, transferimos residência aqui para Tijuca, o ar aqui e outro mais fresco, é verdade, mais puro e saudável ! Da janela do nosso quarto vê-se as verdes matas da Tijuca e atrás bem ao alto o Cristo Redentor, dominando tudo do alto do Corcovado, e, trazendo aos nossos corações, a paz e a confiança que dele irradiam de dia nos reflexos dourados do sol, de noite nos reflexos fulgurantes de sua rica iluminação! 

Gostamos mais daqui, apesar de ser longe da praia, do mar verde, ondulante e sonoro..... mas traiçoeiro em todos os sentidos... numa noite de pálido luar a contemplação do oceano alo lado de alguém, é de veras perigoso! Ih si é ...... A titia manda saudade para nossos tios e primos. 

Abraça-os por mim. Repara minha cara chata! 

Os priminhos vão vem. Adolfo anda novamente com esta massada de prontidões. Rui vai bem, passou conosco suas férias. Estamos provisoriamente neste quarto, pretendemos nos mudar do dia 15 a 20 para um apartamento aqui perto que estão ainda terminando. Endereça minhas cartas para a pensão.
...
Domingo atrasado fizemos um passeio formidável. Foi a travessia aqui da Tijuca para Gávea. Lindo. Lá vai a narração. Saímos daqui as duas horas duma linda tarde, a Tia e Adolfo na frente, este na direção da barata nossa Suzana ( apelido do carro era Suzana). Rui, eu e provisões atrás, 20 minutos e chegamos na Cascatinha, lindo lugar, muito concorrido, tenha uma cascata duns 100 metros de altura, muito pictoresco. Mais meia hora sempre subindo e estávamos na Gruta de Paulo e Virgínia, muito lindinha. Seguimos a esquerda, sempre subindo, tendo acima serra com mataria e abaixo profundo Valle, e adiante as praias, casaril e o mar. Seguimos assim uma hora e chegamos no açude Solidão, lugar encantador no meio do mato no nível do Corcovado. Um frio incrível tivemos que por os casacos que felizmente havíamos levado, pois estávamos no meio das nuvens. Iniciamos ai a descida que muito susto nos deu, pois era a pique com curvas fechadas e precipícios medonhos! Logo após e, faixa de cimento a Legação Porto Americana.


Calcula naquelas alturas, mais de 40 metros descendo sempre e chegamos no Alto da Boa Vista, lugar povoado bonito. Mais 15 metros Vista Chinesa, chato! Chegamos depois nas Furnas, lugar afanado, são rochas formando subterrâneos. Ali havia muita gente. Olhávamos para frente e víamos a estrada em espiral, clara no meio da mataria cerrada, bem ao fundo a Barra da Tijuca, vista formidável. Continuamos depois de algum tempo de marcha regular, chegávamos ao Campo de Itanhangua linda várzea e campo de esportes, assistimos a uma disputa de pólo. Adolfo cansado passou o Rui para a direção, depois de terminarmos a merenda que havíamos começado na gruta, seguimos o passeio agora pelos jardins Gávea, lugar maravilhoso! Começamos nova subida pela avenida Niemeyer, tendo a frente o Gigante deitado de formas humanas perfeitas toda a avenida é ao redor do cerro tendo acima as rochas e abaixo o Oceano e é muito estreita. Rui guiando firme. Chegamos no Joá, um lugar de vista mais linda do Rio. Apreciamos o ascender das luzes e seguimos já escuro pela Gruta da Imprensa, Hotel e Praia do Leblon, Ipanema e Adolfo na direção por causa do movimento. Copacabana, Botafogo, Flamengo, Lapa, Cinelândia, Centro, Rio Comprido e Tijuca as 10 horas da noite.

Que tal, gostaste! Formidável hein !? E os primos são craques na direção, sabes! Domingo passado fomos ate o Joá por Copacabana, a Cléia e a Iracema foram junto. É lindo o passeio. Temos ido ao cinema, fui ver “Cai, cai,balão !” do Eddie cantor, formidável, é uma gargalhada do começo ao fim, já passa a semana no Rex.

Estou fazendo um chapeuzinho de tricô verde para mim, usam muito. Ganhei um traje verde e preto, lindinho. Estou fazendo um tapete de retalhos, vai ficar bonitinho. A Titia não está, foi ao casamento do Armando, irmão da Vanda e filho da Alfredina. Casa agora as três horas, e a Tia Julieta e o Pedro são testemunhas. Não fui porque estou um pouco constipada. A Tia vestiu-se na madame Lili, ficou chique. Toda de preto, chapéu de veuzinho com uma pena verde. A Tia Leocadinha está morando aqui no Rio no Palácio Mármara, 7º andar num apartamento com onze peças. Lindo! Com uma vista maravilhosa, com jardins suspensos. Uma beleza. Seguido vamos lá. Didi todas lá vão bem, a garota da Dalny é tão querida. Têm quatro meses e chama-se Marly. A Eneida é grande e gorda, meio louquinha, criada a vontade, estuda em casa, não é tão bonita como era.
Laurinho vai bem? Abraços a ele, as primas, aos queridos titios o mais saudoso dos abraços e mil beijos da Tua Lieta.

Flávia


Aqui na tijuca sou filha da Tia Julieta. Encontramos num quarto vizinho ao nosso uma ex namorada do Adolfo com a qual brigou a tempo; ela veio logo falar com ele, então ele disse: é já estou casado e ela mais que depressa disse: e eu quase noiva. Sabes o que ela pensa! Que eu sou a jovem esposa dele. É a nossa troça. Ih! Me olha com uma cara tão feia! Nem queira saber! Para mais dos pecados, tem nos encontrado sempre de braço no cinema, na avenida nós dois passeando na barata, ele vem cá todos os dias etc...... Que contente ela ficaria se soubesse a verdade! Quem me escreveu foi a Ruth, uma amável carta, pergunta pelo meu ex namorado. Diz que o pessoal lá anda numa torcida, mas, acho que só quem torce de fato é ela! Mandei dizer que briguei, toca agora a vez do macaco morder o seu rabo, já que gosta tanto que os outros mordam.

Adeuzinho!
Beijos da tua Lieta (Vó Lia)